A advocacia do Caparaó capixaba testemunhou, em 2025, um marco inédito quando a advogada Flávia Vieira de Paula tornou-se a primeira mulher a assumir oficialmente a presidência da 6ª Subseção da OAB-ES, ainda que de forma interina. A conquista, registrada no Diário Eletrônico da OAB, inscreveu seu nome na galeria de presidentes e simbolizou mais do que uma alternância administrativa: foi, sobretudo, um gesto de representatividade em uma instituição historicamente comandada por homens. Com quatro mandatos como vice-presidente, Flávia carrega o peso da experiência e a leveza da inovação. “Assumir a presidência, mesmo de forma interina, como a primeira mulher da história da 6ª Subseção, representou não apenas um marco pessoal, mas também um avanço institucional no reconhecimento do espaço da mulher na advocacia”, comenta. O feito, é bom reconhecer, ocorre num momento em que a equidade de gênero na advocacia deixou de ser apenas discurso para virar uma prática efetiva. Flávia conversou sobre o tema com o advogado e jornalista Wellington Cacemiro.
A senhora fez história ao se tornar a primeira mulher a assumir oficialmente a presidência da 6ª Subseção. Como foi receber essa responsabilidade e qual o significado pessoal e profissional desse marco para sua trajetória?
Foi um momento de muita emoção e responsabilidade. Assumir a presidência, mesmo de forma interina, como a primeira mulher da história da 6ª Subseção, representou não apenas um marco pessoal, mas também um avanço institucional no reconhecimento do espaço da mulher na advocacia. Profissionalmente, foi a consolidação de anos de dedicação, e pessoalmente, um orgulho enorme por abrir caminhos para que outras colegas também possam sonhar e alcançar esses espaços de liderança.
Embora tenha sido uma gestão interina, o período foi marcado por continuidade de projetos e fortalecimento institucional. Qual foi o maior desafio que enfrentou?
O maior desafio foi conciliar a manutenção da rotina administrativa com a expectativa natural que surge quando há uma mudança de comando. Era essencial garantir estabilidade, dar continuidade aos projetos em andamento e, ao mesmo tempo, imprimir sensibilidade feminina na gestão, sem deixar que a interinidade fosse vista como um período de paralisação.
Durante sua gestão, houve avanços no fortalecimento do projeto “OAB na Escola”. Pode nos explicar como funciona essa iniciativa e qual a importância de aproximar a advocacia das instituições educacionais na região?
O projeto “OAB na Escola” é uma das iniciativas mais gratificantes que temos. Ele leva conhecimento jurídico básico para os alunos da rede pública, abordando temas como cidadania, direitos fundamentais e noções de ética. Aproximar a advocacia das escolas é fundamental para formar cidadãos mais conscientes de seus direitos e deveres, além de inspirar jovens que podem vir a se tornar futuros advogados.
A região atendida pela 6ª Subseção engloba seis municípios, incluindo áreas rurais e de menor densidade populacional. Quais são os principais desafios específicos que os advogados enfrentam nessa região e como a OAB tem trabalhado para superá-los?
Os maiores desafios são a distância dos grandes centros e a carência de estrutura judiciária, o que acaba sobrecarregando advogados e jurisdicionados. A OAB tem atuado fortemente em diálogo com o Tribunal de Justiça e outras instituições para garantir melhores condições de trabalho, mais juízes e servidores, e também investido em melhorias nas salas de apoio e na digitalização de processos, para reduzir barreiras geográficas.
Esta foi sua quarta eleição consecutiva como vice-presidente antes de assumir interinamente a presidência. O que a motivou a persistir nessa trajetória de liderança institucional e como sua experiência prévia a preparou para este momento histórico?
Minha motivação sempre foi a vontade de servir à advocacia. A cada mandato como vice-presidente, aprendi um pouco mais sobre a complexidade da instituição e as demandas dos colegas. Essa experiência acumulada me preparou para assumir a presidência com serenidade, garantindo continuidade e responsabilidade, sem perder de vista a inovação e o diálogo.
O Brasil tem hoje uma advocacia majoritariamente feminina, mas ainda há sub-representação em cargos executivos. Na sua visão, quais são as principais barreiras que as mulheres advogadas enfrentam para alcançar posições de liderança?
As barreiras ainda estão ligadas a questões culturais e estruturais. Muitas vezes, a mulher enfrenta o desafio de conciliar família, carreira e representatividade institucional. Além disso, ainda existe uma visão preconceituosa de que cargos de comando devem ser ocupados por homens. Felizmente, isso vem mudando, e acredito que quanto mais mulheres ocuparem espaços de liderança, mais natural essa presença se tornará.
Durante sua gestão, foram mencionados esforços para ampliar os “diálogos institucionais”. Pode detalhar que tipo de parcerias e interlocuções foram estabelecidas e como isso beneficia a classe advocatícia local?
Buscamos estreitar relações com escolas, órgãos públicos e entidades da sociedade civil. Esses diálogos são importantes porque fortalecem a imagem da OAB como uma instituição parceira da comunidade e ampliam os espaços de atuação da advocacia. Na prática, isso se traduz em mais oportunidades para os advogados e em uma presença mais efetiva da Ordem no dia a dia da população.
Como a senhora avalia o papel da OAB na defesa das prerrogativas profissionais e na promoção da Justiça em municípios menores, onde muitas vezes há menos recursos e infraestrutura jurídica?
A OAB tem um papel indispensável, sobretudo em municípios menores, onde os advogados são, muitas vezes, a principal voz da cidadania. Defender prerrogativas nessas localidades é lutar para que o advogado possa atuar com dignidade e independência, o que, por consequência, assegura maior acesso à Justiça para a sociedade.
Seu nome agora integra oficialmente a galeria de presidentes da instituição. Que legado a senhora espera deixar para as futuras gerações de advogadas que possam se inspirar em sua trajetória?
Espero que meu nome inspire outras mulheres a acreditarem que é possível chegar aonde desejarem, mesmo em espaços tradicionalmente ocupados por homens. Meu legado é o de coragem, de serviço e de comprometimento com a advocacia, mostrando que a liderança feminina é não só possível, como necessária.
Considerando o contexto nacional de crescente protagonismo feminino na advocacia, como a experiência da 6ª Subseção pode servir de modelo para outras regiões do país na promoção da equidade de gênero?
A 6ª Subseção demonstra que a presença feminina nos espaços de liderança fortalece a instituição. O modelo é simples, mas poderoso: abrir oportunidades, confiar nas mulheres e reconhecer sua competência. Acredito que essa experiência pode inspirar outras subseções a avançarem na mesma direção, tornando a equidade de gênero um compromisso real e não apenas um discurso.
Olhando para o futuro, quais são as principais prioridades e desafios que a senhora identifica para a advocacia na região do Caparaó capixaba, e como a OAB pode continuar evoluindo para atender melhor às demandas dos profissionais e da sociedade?
A prioridade é continuar lutando por mais estrutura judiciária e pelo fortalecimento da advocacia do interior. Precisamos de fóruns funcionando plenamente, juízes titulares e mais investimento em tecnologia. Ao mesmo tempo, temos que valorizar a formação continuada dos advogados e ampliar nossa atuação social. O desafio é grande, mas com união e diálogo, tenho certeza de que a advocacia do Caparaó continuará crescendo e se fortalecendo.